Thursday, February 22, 2007

Todo dia o sol se põe.
Toda lua é uma fase.
Todo ódio se transforma.
Todo raiva deforma.
Toda luz se apaga.
Toda sombra some.
Todo mar sobe.
Todo rio desce.
Todo futuro se desconhece.
Todo presente se dissolve.
Todo passado passa.
Toda a amizade se dispersa.
Toda paixão se esvai.
Todo amor se acaba.
Todo carnaval tem seu fim.

Monday, February 12, 2007

Summer Interior (conto baseado no quadro Edward Hopper)


A cortina estava mal fechada e um feixe de luz invadia o quarto. Ana colocava a mão no rosto relutando em acordar.
Durante a noite ela sonhou com homem de cabelos pretos e terno cinza. O rosto era sombra. Cobriu o rosto com o lençol tentando fugir da luz que entrava pela janela. Era uma manhã de verão, o sol estava forte e o céu estava azul. O telefone tocou e Ana foi obrigada a acordar.
Uma voz desconhecida do outro lado com uma fala seca dizia coisas que Ana não compreendia. “Quem? Aonde?”, Ana perguntava, mas a voz falava tão rápido que ela não tinha tempo para assimilar as coisas. Perguntou se o que o homem dizia era verdade e a resposta afirmativa a fez ficar mais confusa. O homem então desligou o telefone. Ana conseguiu entender apenas algumas palavras: Pedro, carro, infelizmente. Tentou ligar os fatos mas os fatos não se ligavam. Pedro passou a noite naquele quarto de hotel e havia saído de lá há apenas dez minutos atrás para comprar um pão fresco e um café quente na padaria da esquina. Ana gostava de café bem forte para acordar e naquele hotel só se fazia café fraco, então Pedro foi na padaria da esquina. Ele saiu de lá saltitando de felicidade, pela primeira vez levaria café na cama para alguém que realmente amava. E Ana dormia sorridente ainda sentindo pelo corpo o prazer que sentiu durante a noite. Antes de sair Pedro deu um beijo em Ana e prometeu não demorar. Não queriam ficar nem um segundo sem se tocar.
Eles estavam tão felizes que Ana não conseguia entender a palavra “infelizmente” que vinha do outro lado da linha telefônica. Pensou e pensou. Decidiu levantar da cama se arrumar para quando Pedro chegasse. Queria estar linda e tinha que se arrumar rápido pois Pedro prometeu não demorar. “Só pentear um pouco o cabelo e lavar o rosto, isso não demora”. Então Ana se levantou e subitamente todas as palavras ditas ao telefone fizeram sentido. Suas pernas ficaram fracas. Ana caiu no chão e chorou.

Sunday, February 04, 2007

Ela

Seus cabelos brancos pesavam em sua cabeça, mas ela ainda era jovem, pelos menos jovem no olhar. Ela sabia o que queria, mas sempre ficava na dúvida. Uma dúvida que a dissolvia até ela ficar pálida, quase transparente. E seu medo de transparecer seus sentimentos e pensamentos com tamanha transparência era tão grande que ela sorria o tempo todo ou não sorria nunca. E falava de coisas fúteis e de idéias mirabolantes. Mas no fundo ela sentia medo, só medo. Seus cabelos brancos mentiam por ela uma idade e uma maturidade que ela ainda não havia alcançado. Desde os nove anos eles estavam ali em sua cabeça. E ela esqueceu que precisava crescer. Não, ela não cresceu. Agora ela sofre, mas ri para não transparecer. Agora ela precisa crescer mas não quer. Agora sua cabeleira é grisalha e ela não tem mais nove anos. Ela tenta e tenta viver no mundo da lua como vivia. Pensa que seus cabelos brancos e sua pele pálida são conseqüências de uma boa vida lunar. Ainda sonha em ser astronauta. E seus sonhos ainda enchem seu peito de alegria e ainda tiram seus pés do chão. “Volta menina, não se vá voando com o vento”, era o que sua mãe dizia quando ela era pequena e magrela porque não comia. Mas agora ela come bem e sua mãe continua dizendo: “Volta menina, não se vá voando com o vento”. Pra conseguir viver fora do mundo da lua ela foi fazer algo não muito terrestre, mas já era uma tentativa. Viver num mundo branco onde cores vão surgindo trazendo imagens em movimento. Sempre pálida agora ela sorri com um pouco mais de transparência. E seus cabelos grisalhos brilham com a luz do luar. Ela ainda visita a lua frequentemente sonhando em ser astronauta. Ela ainda pensa que é criança e tenta a todo custo voar com o vento. Ou colocar seus sonhos dentro de um foguete.
10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
Ela continua aqui.