Monday, April 18, 2011

Escangalhada

O relógio parara de bater. As horas pareciam estáticas. Deitada em sua cama ela olhava para o teto branco e, entre muitos outros pensamentos, ela pensava por que mesmo não tinha pintado o teto de azul? Frio na barriga. Se encolhia. Cobria a cabeça com as cobertas. "Pára dor, pára!" Mas a dor tinha vida própria. O tempo passava rapidamente devagar. Ela não sentia o tempo passar. Ela morria de angustia do tempo que passava.
Tic tac tic tac. Tum tum tum. Seu coração estava estático. Seu corpo tremia de frio e suava de calor. As mãos não paravam. As cutículas insistiam em serem comidas. Feridas. Não pára. Feridas.
Ela olhava para o teto e via imagens deles juntos, deitados ali naquela mesma cama sorrindo. Como eles eram felizes, ou fingiam que eram. Ela havia amado ele com todo o corpo. Ele... ele sim. Ele dizia que sim. Ela não acreditava. Dentro de palavras bonitas, ele dizia pequenas crueldades e se esforçava a todo custo por não demonstrar afeto algum. Ele dizia que amava, mas não queria amar. Ela queria tanto... Ele virou as costas e saiu.
Ela ficou parada, asfixiada. O relógio parou de bater. Ela se olhava no espelho, e por mais que se achasse bonita não via como, não via quando, não via por quê, não via o que de interessante.
Deitada na cama, acordava cada dia ao lado de um. Um, dois, três, quatro, cinco... Ninguém. Não havia um que ela gostasse. Não havia um que gostasse dela. Ela se fechava, expulsava eles de sua cama, ia embora, não ligava. Chorava. Ela não sentia o tempo passar. O tempo passava rapidamente devagar. Ela não sentia o tempo passar. O relógio parara de bater. O coração estava estático. Escangalhou. Escangalhada. Ela estava escangalhada.

Wednesday, April 13, 2011

Me despeço.

Ele se foi e continua aqui. Sentado ao meu lado olho para ele, pego em sua mão e o que mais sinto é saudade. De olhos fechados ele não me olha, ele não me reconhece, ele não sabe meu nome. De olhos abertos eu seguro o choro. Ele não sorri mais com os olhos espremidos. Ele não canta mais, não fala mais coisas engraçadas. Ele não se confude mais. A cabeça dele se confundiu tanto que foi embora de vez. Ele se foi e continua aqui do meu lado.
Ninguém mais vai a praia de chapéu, nenhum indío invade mais a casa, o papagaio não come mais whiskas nem veneno, ninguém ganha mais flores no dia do aniversário. A casa de janela azuis é cada dia mais triste.
Penso que é melhor ele ir logo, penso que queria ele aqui comigo de verdade. Não sei o que pensar. Não gosto mais de olhar para ele, ele não sorri mais para mim. A gente não consegue mais se entender, e eu sofro. A ausência com prensença é mais dolorida que a ausência real.
Sentada ao seu lado, o corpo dói de saudade, os olhos se enchem d'água. Me despeço, ou tento. Ele não está mais lá.